Opinião: para Ronnie Von, ‘programas de má qualidade são um desrespeito à comunicação no Brasil’

Ronnie Von, como músico e apresentador, é um nome que dispensa apresentação e um alguém que sempre preza por qualidade: “programas de má qualidade podem, eventualmente, dar muita audiência, mas são um desrespeito à comunicação no Brasil”, avalia Ronnie.

Sobre o fato de seus convidados se sentirem tão à vontade durante as conversas, ele entrega a receita: “são todos amigos”.

Na entrevista a seguir, o apresentador, que acaba de completar 81 anos, fala sobre o momento da carreira, uma novidade musical, entre outros temas. Acompanhe:

Como você observa o momento da sua carreira na TV e na música?

RV – Na TV, pelo menos para mim, ainda há um pouco de vida inteligente. Para mim, essa atividade, esse ofício, ainda está bastante vivo. Eu tenho paixão por televisão. Agora, a música para mim hoje é um diletantismo. Vou explicar: eu não faço mais shows, não quero mais viajar.

Como se diz, ‘já amassei muito barro na estrada’, já viajei muito, já negligenciei minha família em função disso, então, não quero mais essa atividade profissional na minha vida. Mas entrar no estúdio e gravar músicas, eu adoro, gosto muito!

Inclusive, estou fazendo um álbum de jazz. Conheci uma cantora muito, muito talentosa, a Sarah Zeffer, e queria gravar uma música com ela, porque me pareceu simpático e pelo talento dela. Queria fazer com que isso servisse, de certa forma, de um incentivo, então, para mim, também seria maravilhoso!

No dia seguinte, o produtor entra na minha casa com uma banda de não sei quantos músicos, com arranjo, com não sei o quê… Resultado: vou gravar um álbum inteiro com ela. Inclusive, será lançado um EP com a música chamada “Come Fly With Me”. É só jazz, o disco inteiro de jazz, e está ficando tão bacana, com a banda americana e tudo.

Isso eu acho bom, mas o negócio é televisão.

Direitos autorais da música! Os órgãos estão mais organizados, estão acompanhando essa mudança no digital/streaming?

RV – Bom, eu sou ‘filhote’ de gravadora e editora musical e não vi absolutamente nada de diferente até agora. Não, pelo menos, em relação ao meu trabalho. Nunca vi nada diferente. Essa coisa de streaming, por exemplo, que para mim é uma novidade — afinal, eu sou um dinossauro (risos) —, não tenho habitualidade com isso, mas que eu tenha visto alguma coisa de diferente para melhor ou para pior? Não vi absolutamente nada.

Direito autoral no Brasil sempre foi uma grande confusão. Funciona para um certo grupo de pessoas e compositores, mas não para todos. Eu estou fora desse grupo com toda a certeza.

Por que os convidados se sentem tão à vontade nos seus programas?

RV – Os convidados que vêm ao programa se sentem à vontade porque são todos amigos. E amigo, se por acaso não tem nenhuma qualidade, eu invento. É um programa de reencontro de amigos. Então, fica fácil, porque todos eles têm a sensação de que estão me visitando em casa ou eu estou visitando. É simples assim.

O “Companhia Certa” é um programa de humanidade, onde eu mostro que os “produtos” que nós somos são abrigados por um ser humano.

Nesse momento de tanta cobrança nas TVs por audiência, é possível fazer um programa de qualidade sem pressão por números?

RV – Bom, essa história da audiência, eu acho que existem dois fatores. Programas de má qualidade podem eventualmente dar muita audiência, mas são um desrespeito à comunicação no Brasil.

Em contrapartida, existem — e têm visões eventualmente equivocadas — aqueles que veem a audiência como a solução final, e não é assim.

Existem programas que dão uma audiência mediana e que são impecavelmente realizados, e esses vendem, embora a audiência seja menor do que esses programas, vamos dizer, popularescos.

Eu acredito, sim, que um programa de qualidade possa não dar uma grande audiência, mas possa dar uma audiência suficiente para atingir um nicho de formadores de opinião que possa levar isso adiante, porque a grande escola do brasileiro ainda é a televisão.